Há palavras terríveis pelo abalo que nos causa a sua carga emocional. Mas o que é verdade para uns, não é para outros. Tomemos a palavra: aborto. Associo imediatamente ao brasileiro: brotinho (Brasil, pop., rapariga ou rapaz entre os 14 e os 18 anos; dim. de broto) que até tem qualquer coisa de carinhoso. Como uma flôr que brota, que desabrocha. Seria como chamarmos a estes seres na primavera da sua sexualidade: desabrochinhos.
Quem disse que a palavra aborto devia ser abolida em detrimento de interrupção voluntária de gravidez teve a maior ideia de jerico. Não se pode condenar uma palavra ao oblívio. E a fazê-lo, antes teria de vir sovaco.
Imagine-se agora os puristas de bolso da língua portuguesa, aqueles que corrigem as legendas dos filmes, que não perdoam um pontapé na gramática, na sua prática diária:
"Olha, olha, a missão daquele grupo de fuzileiros teve a gravidez voluntariamente interrompida pelo seu superior imediato."
Ou "A contagem decrescente foi voluntariamente interrompida na sua gravidez por se ter detectado um erro no protocolo de lançamento do foguetão"
Ao que parece aborto voluntário designa a interrupção de uma tarefa que não pode ser levada a bom termo. Quando se prevê que vá correr mal e se pode prevenir o total fracasso, aborta-se para poupar recursos.
Ainda há quem conteste que poderia ser utilizada na sua abreviatura: IVG. Convenhamos que as iniciais por "I" já nos trazem dissabores suficientes. Não é assim que se convencem os portugueses sobretudo os que já fazem um sururu por pagarem IRS, IMI, IVA, ICV...
No meio dos fundamentalismos liofilizados não se pode cair no erro clássico de tomar a parte pelo todo. Abortos há muitos e alguns até são expontâneos.