domingo, janeiro 28, 2007

pelo nao pelo sim...


Há palavras terríveis pelo abalo que nos causa a sua carga emocional. Mas o que é verdade para uns, não é para outros. Tomemos a palavra: aborto. Associo imediatamente ao brasileiro: brotinho (Brasil, pop., rapariga ou rapaz entre os 14 e os 18 anos; dim. de broto) que até tem qualquer coisa de carinhoso. Como uma flôr que brota, que desabrocha. Seria como chamarmos a estes seres na primavera da sua sexualidade: desabrochinhos.

Quem disse que a palavra aborto devia ser abolida em detrimento de interrupção voluntária de gravidez teve a maior ideia de jerico. Não se pode condenar uma palavra ao oblívio. E a fazê-lo, antes teria de vir sovaco.
Imagine-se agora os puristas de bolso da língua portuguesa, aqueles que corrigem as legendas dos filmes, que não perdoam um pontapé na gramática, na sua prática diária:
"Olha, olha, a missão daquele grupo de fuzileiros teve a gravidez voluntariamente interrompida pelo seu superior imediato."
Ou "A contagem decrescente foi voluntariamente interrompida na sua gravidez por se ter detectado um erro no protocolo de lançamento do foguetão"

Ao que parece aborto voluntário designa a interrupção de uma tarefa que não pode ser levada a bom termo. Quando se prevê que vá correr mal e se pode prevenir o total fracasso, aborta-se para poupar recursos.

Ainda há quem conteste que poderia ser utilizada na sua abreviatura: IVG. Convenhamos que as iniciais por "I" já nos trazem dissabores suficientes. Não é assim que se convencem os portugueses sobretudo os que já fazem um sururu por pagarem IRS, IMI, IVA, ICV...
No meio dos fundamentalismos liofilizados não se pode cair no erro clássico de tomar a parte pelo todo. Abortos há muitos e alguns até são expontâneos.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

pelo sim pelo não...



Não há nada melhor que a frase que me ricocheteia nas meninges:
"...porque às 10 semanas já bate um coração!..."

Gosto especialmente porque:
  1. o que nos distingue dos animais é o facto de sermos racionais. Foi assim que ainda miúdo aprendi na escola a distinguir um Homo sapiens sapiens. Se calhar dever-se-ia pedir prova das sinapses próprias de uma intelegência abstractiva. O único problema em explicar tudo isto é que obrigaria às letras a ficarem muito pequeninas por muito grande que fosse o cartaz preto.
  2. me apetece responder com a pergunta, "o que se considera um coração? ". Pronto, sendo o mais adolescente e irritante que posso: O dos répteis com apenas duas cavidades pode ser considerado? Serão mais vivas as aves que árvores?
  3. o bater do coração é poeticamente o amor *suspiro*. Já dizia Pessoa que o Quinto Império viria a ser nosso outra vez. Só não imaginei que o lirismo nos desse para isto.
  4. a direita que traz esta frase na boca é a mesma que não condena touradas.
  5. os corações são uma óptima arma de arremesso mas também a evitar sobretudo quando se joga copas online.
Não me interpretem mal. O argumento é sofrível mas encanta-me dentro da perspectiva "bugalhos" que falei antes.

(Espero que o post não seja vítima de um qualquer tótó fanático a rebater-me ponto por ponto)

segunda-feira, janeiro 08, 2007

todos a borto!



Nada pior do que discutir alhos atirando-se uns bugalhos para o ar.


Hoje imaginei-me sendo uma grávida numa maca às portas de um bloco operatório para fazer um aborto. Depois de consideradas todas as opções seria a última hipótese de mudança que me restava. Ainda assim tinha um pesar latente na cabeça oscilante entre o (a) isto é para outra fase da minha vida, agora não poderei dar a felicidade que intento, só vou estragar a minha e a vida do que aí vem; e o (b) eu devia era ter esta criança porque Deus Nosso Senhor providenciará e enquanto eu tiver bracinhos para trabalhar há-de haver comida na mesa para todos.

Vêm as senhoras do barco do arco-íris (vindo da holanda tem de ser sempre fruta-cores) e dizem-me ali de perna escancarada: "Vai miúda, tu és senhora da tua vida e tens todo o direito de decidir o que é melhor. Azares acontecem e não vale a pena trazeres para aqui alguém que não vai ser querido e amado como tu queres. Ter filhos é boa onda mas só quando forem planeados."

E aí vou eu. Abram-se as portas do bloco, empurrem-me a maca para dentro!


Param-me a maca umas senhoras muito descontraídas que também aparecem em revistas. Levantam a sobrancelha e dizem: "Onde é que vais miúda?! Ja pensaste bem no que vais fazer? Vais matar o que pode ser o próximo Enstein. Ok, mesmo que seja um Castelo-Branco não lhe irias negar o teu amor. Toda a gente consegue educar uma criança surpresa. Olha a tua volta. Se não tivessemos andado para a frente com tantos indesejados ainda estávamos à espera de D. Sebastião."... "e depois, às 10 semanas já há um coração a bater!!"


Eu mesmo estando de 7 semanas achei tal o impacto que gritei para fecharem as portas do bloco e meterem a maca em marcha à ré.


Agora fiquei com 2 grupos de senhoras a ajudarem-me a formular a moral para abortar ou não. Cada um empurrando a maca num sentido oposto e eu ali de perna aberta.


Já no banho o sonho não me saía da cabeça. Até que com uma borracha psíquica esborratei tudo. Que me interessa isto? Só se for do ponto de vista de discussão filosófico-académica de tertúlia de fim-de-semana.

O referendo que vem aí é sobre se a mulher da maca que já saiu do bloco com aborto feito deve ou não ser acusada de um crime. Estes são os alhos, o resto são bugalhos...
 
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