quinta-feira, setembro 30, 2004

A cidade em contra-fase

Lembram-se da teoria das ondas? Quando os picos são sobreponíveis elas estão "em fase" e somadas ampliam-se. Quando os picos de uma coincidem com os vales da outra estão em "contra-fase" e, se de intensidade igual, somadas anulam-se.

Bruxelas funciona como duas ondas, dois universos paralelos completamente fora de fase.
Bruxelas dos que são belgas e convivem com a migração de trabalhadores servis, pobres e estrangeiros tanto europeus como não-europeus para um emprego infra-remunerado. Brochelas, a cidade que alberga as instituições europeias e que sofre de migração de trabalhadores especializados ricos, na sua maioria Europeus, jovens e supra-remunerados.

Claro que duas pessoas que tenham a mesma nacionalidade mas vivam em Bruxelas diferentes não se encontram, anulam-se eventualmente.

Chamemos as coisas pelos nomes: "emigrantes" e "expatriados", os primeiros moram na capital Belga os segundos na Capital Europeia. E sim, um belga pode ser ele próprio um expatriado em Brochelas.

Outra pergunta que inteligentemente se pode colocar é: "Sim senhor, já percebi a diferença de conceitos que até me enfadou um pouco, só não percebi o étimo do neologismo Brochelas".
A explicação é fácil e reside na analogia com algo que, para o frete que envolve, é muito bem pago.

Quanto a mim, reúno o pior que existe nos dois. Considero-me como que um electrão sujeito a duas ondas, a eléctrica e a magnética. Sou um trabalhador voluntário e eléctrico a viver a vida magnética dos expatriados.
Sou também a Olívia patroa e a Olívia costureira mas isso fica para outro dia.
(e cuidadinho com os comentários que a minha mamã lê o belogue)

quarta-feira, setembro 29, 2004

A mais louca epopeia de Dom Cócó

(Atenção: a aventura que se segue foi inspirada em factos reais, no entanto nem sempre os mais rocambolescos serão mentira )

Era uma vez uma civilização avançada. Faz de conta que os transportes que lá havia eram eficientes e andavam muito, muito rápido. Um desses transportes era o avião, geringonça em forma de cruz que andava pelo ar.

Houve um dia que Dom Cócó resolveu fazer uma viagem para muito, muito longe e para lá chegar foi de avião. Chegado à estação dos aviões ainda passou um bom bocado de cú para o ar a fechar a sua mala que ia no porão. Dom Cócó gostava de tudo muito bem apertadinho para que não se partisse no caminho por já conhecer os modos brutos dos simples operadores das malas.
Dom Cócó gozava de um charme natural que herdara certamente de um parente distante e valeu-se dele para que a menina das malas não lhe cobrasse nem mais um pataco pelos seus 60 kilos de malas que carregara tão corajosamente até ali.

O avião que Dom Cócó fretara leva-lo-ia a Madrid, capital de um reino vizinho. Viajavam também nesse dia para o mesmo destino:
- equipa brasileira de 100 metros em corrida de sacos da terceira idade;
- quatro cavaleiros templários paramentados, 3 dos quais ainda com o corte de cabelo iniciático;
- executivos variados, a maior parte com nódoas na gravata;
- um senhor muito chato que de certeza era da famíla dos Fodematola.

Quis o destino que o avião se atrassasse a chegar, tinha vindo de Dakar e precisava de descansar e refrescar-se. Quis outra vez o destino que dois passageiros chegassem muito, muito atrasadinhos. Voltou a querer o destino que à última da hora caísse um repentino nevoeiro sobre a pista.
Dom Cócó não se preocupou com o atraso de uma hora na partida do seu transporte. Pois se o destino tinha consentido nesta situação, pois o próprio destino se encarregaria de a resolver. O destino ia querer outra vez! Entretanto conformava-se com a condição e refastelava-se com uma refeição opípara servida com simpatia.

Apercebe-se à chegada que a hora de partida do seguinte avião tinha sido ultrapassada, podendo isso consistir problema para a prossecução da sua viagem. Quis porém o destino (eu não disse?!), quis ele, que o vôo tivesse sido cancelado. O avião estava indisposto e recusava-se a sair do local.
A empresa que geria a estação de aviões em madrid - Ibérdia - prontificou-se a resolver tudo enviando os pasageiros noutros aviões, estes já gozando de boa saúde, e até entregando cupões de desconto para refeição e artigos variados dos quais destaco os abanicos coloridos.
Viajou assim Dom Cócó na virginiana companhia dormindo exausto todo o caminho.

À chegada, Dom Cócó sentiu um certo ardor no peito. Pegando nas malas olhou em volta para aquela babel de desconhecidos e rapidamente procurou os elevadores. Com tanto atraso perdera também a estalagem que tinha marcado de antemão. Prontificou-se Dom Cócó a pedir que lhe enviassem o número que ele próprio se encarregaria de falar com a estalagem para que lhe guardassem lugar e lhe fossem aquecendo a água do banho.
E assim foi...

(Para que não pense que a sua mente não lhe prega partidas: os templários eram a sério)

terça-feira, setembro 28, 2004

Ouvi dizer que cheiram mal

Vou amanhã para Bruxelas.

Depois de um mês de aturada pesquisa interneteira sem conseguir encontrar casa para alugar tomei uma decisão drástica... ou antes, dramática + trágica.
Tenciono ficar num daqueles albergues de juventude ociosa, até encontrar um poiso fixo que não me saia caro nem fique num ghetto de emigrados menor-asiáticos.

Ontem sonhei que chegava lá sem malas. Não me parecia incomodar com isso e passeava pelas ruas com uma mochila a dar-a-dar enquanto levantava o queixo procurando nas janelas contactos de aluguer.
O sonho não tinha cheiro. Não sei porquê sempre tive a impressão que os belgas cheirariam mal. É uma assunção cabotina, assumo, mas sei exactamente por que a tenho. Atribuo as culpas a um belga que conheci uma vez num bar do Bairro Alto. Um tal de amigo-de-não-sei-quem, cuja pitadinha fétida da axila me feria como se me assoasse a lixa diamante.

Espero não me esquecer de nada e que a divina providência impeça que as minhas malas se extraviem na viagem.
Vou amanhã para Bruxelas, se Deus quiser e a Iberia deixar.
 
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